Memórias Paroquiais de Cabeceiras de Basto
Arco de Baúlhe (ano de 1758)
É o orago desta freguesia S. Martinho do Arco de Baúlhe, que é Província de Entre Douro e Minho, Arcebispado de Braga, comarca de Guimarães, termo e concelho de Cabeceiras de Basto e é de Sua Majestade que Deus guarde.
Vizinhos e os fregueses desta paróquia são cento e setenta e cinco fogos e pessoas de ambos os sacramentos quinhentos e vinte e nove e o número de pessoas que nela vivem entrando ainda crianças são setecentas e doze.
Está situada em um vale que logo nascendo o sol a visita com seus raios, as povoações que descobre é a maior parte do concelho de Cabeceiras de Basto que lhe fica para a parte do Norte. E para a parte do Nascente descobre terras e freguesias já da Província de Trás-os-Montes. Aldeias.
A paróquia está situada no mais alto da freguesia e além das casas do reverendo pároco só tem três vinhos [sic, por vizinhos]. Tem a freguesia o lugar do Arco que é arruado e consta de cinquenta e nove vizinhos, Baúlhe lugar de poucos vizinhos, o lugar de S. Martinho, Morgade, Portela e Casal e Telhado. Todos lugares sem serem povo que vivem juntos mas quase em seus casais.
Tem a igreja de S. Martinho além do altar do orago, o altar do Menino Deus e de Nª Srª do Rosário, a capela do Santíssimo e o altar de S. António. E no mesmo altar está Sta Rita; esta é visitada de vários devotos e confessam ter recebidos mercês da tal santa, trazendo-lhe ofertas e votos com que se vai ornando o tal altar. Há neste altar a confraria da Correia de Stº Agostinho e há a irmandade das Almas e é altar privilegiado para todos os confrades falecidos, por cujas almas se disserem missas nas Segundas-feiras.
Há outra Bula de altares privilegiados todos os da igreja para os confrades da dita irmandade das Almas e esta é perpétua. Neste altar está também S. Sebastião. O pároco é vigário apresentado pelos padres de S. Jerónimo do colégio de S. Jerónimo da Universidade de Coimbra. Ao pároco dão os sobreditos padres os seus rendeiros doze mil réis que com ofertas que dão os fregueses poderá render para o pároco cada ano sessenta ou setenta mil réis para o dito Colégio cem moedas pouco mais ou menos cada ano.
Ermidas: tem a capela de S. António no lugar da Portela de presente é administrador dela António Leite Lobo cavaleiro do Hábito. Há no lugar do Arco a capela de Nª Srª dos Remédios administrador António José Peixoto. Há a capela de S. Francisco no mesmo lugar do Arco cujo administrador é o padre João Vilaça. Os frutos da terra desta freguesia que produz com mais abundância é vinho, pouco pão, bastante azeite e bastante castanha e frutas de bom gosto e de toda a qualidade. Há nesta terra e concelho juiz ordinário, câmara é sujeita ao corregedor da vila de Guimarães.
Desta freguesia é natural o reverendo frei Aurélio de S. Tomás, religioso de Stº Agostinho que tendo servido na sua reliam [sic, por religião] todos os honrosos carregos de presente está hoje Governador e Provisor na cidade do Porto. Há nesta freguesia a 21 e 22 de julho uma feira a que vem mercadores vários com suas fazendas e juntamente a comprarem linhos que nesta terra se fabrica com abundância. E é feira franca e é no lugar do Arco.
Há neste lugar do Arco boas estalagens a que acodem muitos hóspedes por ser por este Arco estrada real que frequentam os transmontanos na comunicação que tem com os do Minho alternativa.
20. O correio vem a este concelho de Cabeceiras de Basto ao lugar da Raposeira que dista desta freguesia quase uma légua, chega na Terça-feira e parte na Quinta-feira.
21. Dista esta freguesia da cidade de Braga oito léguas e sessenta da de Lisboa.
26. As ruínas do Terramoto não fizeram mal nesta freguesia. Nesta freguesia não há serra de que se faça ou se possa dar parte. Há criações mas poucas por falta de pastos. Há poucas perdizes, algumas lebres e poucos coelhos. O rio que corre por esta freguesia não tem nome, rio anónimo, toma-o da terra por onde corre, mas corre todo o ano.
Passa pela freguesia de Stª Senhorinha e entra nesta de S. Martinho e logo que entra tem uma açude para dar água a uns moinhos. Logo abaixo tem uma ponte de cantaria muito boa pela qual se comunica esta freguesia com a de Stª Senhorinha e tem sua corrente do Poente para o Nascente. Tem em pouca distância outra açude para outros moinhos, tem 3ª açude para outros moinhos, junta-se-lhe outro rio que vem pela freguesia de S. Miguel de Refojos e nesta vem dividindo esta freguesia da de Stª Marinha de Pedraça.
Há aqui uma ponte antiga de cantaria fazendo estas duas freguesias comunicáveis, vai dividindo esta freguesia da de Stª Marinha ficando esta fronteira com a de S. Martinho.
Tem quarto moinhos nesta freguesia e só em moinhos dá o proveito que do tal rio não sai levadas para fertilizar os campos porque corre muito fundo e com corrente arrebatada se precipita a juntar-se com o rio Tâmega. Mas antes de navegar mais adiante darei parte de uma pesqueira que já avista do Tâmega. Tem o rio pequeno, cai este por duas cachoeiras e dá um salto de coisa de dez, onze palmos e para a parte desta minha freguesia corre por baixo de grandes pedras um caneiro de água.
Em o mais alto deste caneiro se arma uma rede de arco e como os peixes não podem passar as ditas cachoeiras ainda que muito o pretende saltando as cachoeiras pretendendo passá-los até que acertado com a água que corre por baixo das pedras vem a entrar na rede de arco donde há dias que se pesca na rede quantidade de peixes que sucede alguns dias passarem de arroba de peixes.
E a maior quantidade dos peixes é bogas, alguns barbos e também trutas e escalos. Este canal pertence à casa do Telhado de que é senhor Francisco Xavier de Sousa Lobo e Bernardo Teixeira tem as meação deste canal. Finalmente escoa este nosso rio em o Tâmega, o qual corre do Norte para o Sul e vai dividindo esta freguesia de S. Martinho da de S. Paio de Atei para a qual se comunica por barcas.
E corre a unir-se com o Douro e juntos se metem no mar na cidade do Porto, a qual dista desta terra doze léguas. Divide-se esta freguesia da de S. André de Vila Nune por montes rasos ficando esta de Vila Nune da parte do meio dia à de S. Martinho e divide-se da freguesia de S. Tiago também por montes ficando a de S. Tiago correspondendo à de S. Martinho, mas a de S. Tiago da parte do Poente.
Tem esta freguesia de S. Martinho de comprido do Norte ao Sul um quarto de légua e do Nascente para o Poente meio 4° de légua. É o que posso informar desta minha freguesia e não há coisas notáveis de que dê conta somente o que acima tenho dito.
Hoje em S. Martinho do Arco 23 de maio de 1758 anos.
O vigário Henrique de Sousa Lobo. O abade João de Lima Lobo de Noronha. O abade Manuel Ferraz Ribeiro.
(AP)
Referências documentais:
IAN/TT, Memórias Paroquiais, Vol. 4, memória 40, pp. 221 a 223. – Obrigação à fábrica do Santíssimo Sacramento, 1682, 31, 212v. – Obrigação à fábrica da capela do Triunfo de Santa Cruz, 1630, 29, 272. – Obrigação à fábrica da capela da Ordem Terceira de S. Francisco, 1770, 188, 248.
Texto transcrito, com atualização da grafia e pontuação, a partir de José Viriato Capela – As freguesias do distrito de Braga nas Memórias Paroquiais de 1758: a construção do imaginário minhoto seiscentista. Braga: Universidade do Minho, 2003. P. 216-217.